Não sei o que queres dizer com glória, disse Alice.
Humpty-Dumpty sorriu, com desprezo. Claro que não, até que eu te diga. Quero dizer "aí tens um belo argumento que te arruma!"
Mas "glória" não significa um belo argumento que te arruma
, objectou Alice.
Quando eu uso uma palavra, disse Humpty-Dumpty, em tom de escárnio, ela significa o que eu decidir que significa, nem mais nem menos.
O problema é, disse Alice, se se pode obrigar as palavras a significar tantas coisas diferentes.
O problema é, disse Humpty-Dumpty, quem manda. Apenas isso.

Lewis Carroll, Alice no país das maravilhas




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GNM


Nasci muito perto do fim dos anos 70. O meu nascimento aconteceu às primeiras horas de um dia gelado de Dezembro, e, desde aí, jamais consegui libertar-me do frio que se fazia sentir naquele dia. A normalidade foi algo que durante toda a vida inconscientemente ansiei, mas sempre recusei. Em criança ela espreitava-me durante a noite, olhando-me do lado de fora da janela. E eu, fingindo não a ver, fechava as cortinas...

Matem os poetas!

⊆ terça-feira, março 21, 2006 por GNM | . | ˜ 53 comentários »

A Daniel Filipe

Nas páginas anteriormente brancas dos livros inúteis,
Nas velhas caixas de recordações de jovens sentimentais,
No tronco apunhalado da árvore centenária do jardim,
Nas últimas folhas dos jornais locais que ninguém lê,
Letras em cadência de verso denunciam a sua existência.
Em letras pequenas
Do tamanho do amor, da esperança, da saudade,
Versos anunciam que uma pequena alcateia de mulheres e homens,
Guiados por corações sem rédeas,
Escreveu sentimentos proibidos
Em horas de solidão,
Inventando uma subversão a que chamam poesia.
Uma alcateia de mulheres e homens livres,
Com fome e sede de infinito,
Soube dar vida a letras esquecidas.
Basta-lhes um sonho.
A noite.
A paixão.
A beleza de um olhar reluzente.
Armados com caneta e papel,
Camuflados com um olhar humilde
Que disfarça uma insuportável dignidade,
Mulheres e homens inundam a terra árida do mundo,
Com palavras viciosas sob a forma de poemas.
É urgente travá-los antes da contaminação colectiva,
Antes que a epidemia se espalhe
E a poesia se torne numa doença universal.
Justificam-se medidas drásticas.
O presidente que decrete o estado de sítio.
Alerta vermelho!
Mobilização geral!
Chame-se o exercito, a marinha,
Ordene-se que os navios de guerra estejam a postos,
Os aviões devem carregar mísseis e voar imediatamente,
As forças de segurança devem procurar cidade-a-cidade,
Vasculhar bairro-a-bairro,
Revistar casa-a-casa.
Sem esquecer as escolas, os cafés, os jardins…
Existem penas exemplares para quem não denunciar os criminosos,
A situação assim o exige.
Está em causa o futuro da Humanidade.
O futuro do sistema económico que construímos,
O futuro dos desenvolvimentos científicos e tecnológicos,
O futuro das nossas vidas conquistadas com suor e trabalho.
Não se deixem vencer pelo cansaço:
Encontrem-nos!
Só quando conseguirmos eliminá-los poderemos viver em paz.
Num qualquer local desconhecido,
Mulheres e homens perigosos escrevem poemas.
Descurando as suas tarefas sociais,
Semeiam no mundo hieróglifos compadecidos.
É imprescindível intensificar as buscas.
E ao encontrarem esses infames
Esgrimindo verso após verso de caneta em riste,
Não hesitem:
Disparem!
Mesmo que seja amigo de infância:
Disparem!
Colega de escola:
Disparem!
Jogaram juntos com a mesma bola:
Disparem!
Ofereceu-vos da sua comida quando tinham fome:
Disparem!
É possível que sintam uma compaixão tolerante
Quando os descobrirem indefesos perante a vossa espingarda.
Não se deixem comover:
Apertem o gatilho e calem-nos para sempre!
Para bem do mundo,
Procurem a alcateia de mulheres e homens que inventaram a poesia.
É preciso encontrá-los antes que seja tarde...


53 respostas a Matem os poetas!

  1. GNM Says:
    Este poema é inspirado na fascinante poesia de Daniel Filipe (sem qualquer pretensão de comparação da minha parte). Grande poeta que continua amordaçado entre nós!

    Continuem a sorrir!
  2. Anónimo Says:
    "Souberam dar vida a letras esquecidas."
    Epá Gonçalo... Um cadinho forte, tens razão é um doença... Mas eu adoro tar assim doente e k otos tmb o estejam para os podermos ler... A poesia extravasa o k sentimos duma forma...nem sei bem como.
    "Guiados por corações sem rédeas,
    Escreveram sentimentos proibidos
    Em horas de solidão,
    Inventando uma subversão a que chamam poesia."
    Aki reside a beleza de tudo...
    Um sorriso =D e uns bjitos
  3. Nina Says:
    Um bom texto :)

    Beijinho
  4. Maria Carvalho Says:
    Está maravilhoso o que escreveste...vamos morrer todos!! Bolas, claro que não...uma caneta, um papel é por demais importante que qualquer arma! Adorei...beijos
  5. Desconhecida Says:
    Volta sempre!
  6. Raquel Vasconcelos Says:
    Fantástico!
    Cada vez gosto mais de te ler!
    Sem exagero ou falsidade!
  7. Madeira Inside Says:
    Um texto realmente magnífico...até fiquei arrepiada ao ler a parte do fim!!
    Bem...vou esconder-me!! HEHE!!

    Sorri e beijinhos :)

    Bom resto de semana!!
  8. Fragmentos Betty Martins Says:
    Tenho pouco a dizer, depois de ler "Matem os Poetas"

    Por uma simples razão: está lá tudo!

    Acrescento; está magnifico!!!

    PARABÉNS!

    Um Beijo
  9. Marta Says:
    e na mais bela descrição do q éser poeta digo q já é tarde demais...o poeta, a poesia, n contaminou o mundo mas sim as almas q, sedentas de infinito, se alimentam das suas palavras...dos seus mil e um sentidos. bjs***
  10. Adonis Says:
    Poemas, gosto de lê-los porém, é tão difícil fazê-los! Parabéns por sua sensibilidade.
    Abraços.
  11. Luís Monteiro da Cunha Says:
    Um lapso importante e esquecido:
    Em cada disparo dessa arma, sai um verso, uma poesia. De dor, de sonho, de vida perdida, de ilusão.
    Dispara camarada, até que a arma que hoje empunhas, seja respeitada, e mesmo que te desunhes, nessa alma ensanguentada, que querias livre e pia, não esqueças que a cada disparo,mais não fazes, que reviver a poesia.

    Abraço
  12. Cláudio B. Carlos Says:
    Obrigado pela visita lá no BALAIO DE LETRAS. Volte sempre.




    É sempre bom lê-lo.


    CC.
  13. Conceição Paulino Says:
    uma triste verdade...os poetas continuama ser uns marginais à luz do senso comum e do establishment. Bom resto de semana, Bjs e:)
  14. Manuela B. Says:
    Eu por mim já estou morta , pois a poesia não me sai ou melhor a alma de poeta foi-se....mas morreu praseirosamente...
  15. nana Says:
    gosto do poder subversivo do Amor, em palavras ou gestos
    que não há quem amordace por muito tempo...
    já coloquei hà tempos um poema dele lá no meu estaminé!
    bonito texto este teu
    neste repete-se a expulsão do Poeta da cidade....
    ;)
  16. mfc Says:
    A poesia é a tela dos escritores.
    Tudo nela pode ser pintado!
    Umpoema violento,lindamente construído.
  17. Mocho Falante Says:
    Vim agradecer a tua visita lá ao meu poiso

    um abraço
  18. Anónimo Says:
    Já te devem ter dito o mesmo um montão de vezes mas fica sabendo que és um grande escritor.

    Grande mesmo.
  19. Nilson Barcelli Says:
    Soberbo. Ironicamente inteligente.
    À medida que ia lendo até pensei ver no final um nome já consagrado.
    Mas não, o poema era teu. É teu.
    Excedeste-te. Ultrapassaste-te.
    É muito raro ver coisas destas, estou sem palavras.
    Parabéns pelo esforço da rajada de palavras e ideias deliciosas.
    Abraço.
  20. Anónimo Says:
    eu vou começar por matar quem fez esta música maravilhosa...;) Um abraço
  21. Anónimo Says:
    Já agora...estiveste a ver o "Equilibrium" :x? Seria uma estranha coincidência se não...
  22. Anónimo Says:
    Quase tudo foi dito neste poema que selecionou. Parabéns pela escolha. Beijinhos.
  23. António Says:
    Magnífico, meu amigo, magnífico!
    És, de facto, um poeta.
    Mais do que isso, um jovem poeta com um futuro a desbravar e construir poesia de alta qualidade.
    Parabéns!

    Obrigado pela tua visita ao meu cantinho.
    No fim de semana sairá o 1º episódio da minha segunda blogonovela ultra-light e pimba!
    Mas com audiência, felizmente...eh eh eh

    Abraço
  24. gato_escaldado Says:
    como os amantes do Daniel Felipe, claro! gostei. abraços
  25. Anónimo Says:
    adoro o que escreves
    e tuas visitas sao sempre um prazer imenso
    beijinhos
  26. Anónimo Says:
    Ena fiquei espantada assim que acabei de ler o poema...e pensei eu já li isto. Mas não era bem isto... Depois de ler os comentários lembrei-me É urgente o amor...adorei!!!
    E o teu tb está muito...mas muito bom.

    um beijo da princesa (vou voltar para te ler com calma)

    ps obrigado pela tua visita ao meu reino o tapete vermelho fica lá...
  27. Curiosa Says:
    Entre cadeias de blogues, passeio de um para outro sem qualquer referencia e "cai" aqui...ainda não me refiz da surpresa da excelente qualidade do teu blogue. Há viagens que valem a pena, encontrei aqui o destino ideal. Parabéns.
  28. I Says:
    sim! sublime! tenho esse poema do Daniel Filipe no Asas! Mas apenas te inspiraste, o teu está lindo e original.
  29. Anónimo Says:
    Obrigada pela visita! Estou passando pra deixar um super beijo e desejar ótimo fds!
    Agradeço sua atenção!
    Mary Help!
  30. Claudia Sousa Dias Says:
    Está fabulástico GnM!

    Dás-me licença de lê-lo em público durante uma sessão de poesia que vai decorrer logo às 21:30 no café concerto da Casa das Artes em Vila Nova de Famalicão?

    Está excelente!

    E ainda há pouco me disseram que o país não vai para a frente enquanto a classe política for composta por poetas e intelectuais...!

    CSD
  31. Manuela B. Says:
    Queres entao dizer que o meu blog não é poetico...sniff...sniff...
  32. Anónimo Says:
    há se fosse possível..o sonho como pandemia...devolvento um grande beijo....
  33. Isa e Luis Says:
    Parabéns! Está belissimo.

    Um beijo grande

    E para não perderes o fio á meada do virtualrealidade fica o novo endereço
  34. Anónimo Says:
    Lindíssimo esse poema.
    Tu escreves maravilhosamente.
    Não sabia que era o Dia da Poesia!
    Acho que vou colocar algo por lá no meu!! Infelizmente não sei escrever poesia...

    Beijo doce
  35. pecado original Says:
    Matem mas eles continuaram a existir... porque a poesia é ar e não se vê, é fogo que queima e deixa o seu perfume, porque poesia é surreal e perfeita nos cantos imperfeitos do mundo.
    Haverá sempre poesia até depois da morte dos poetas.
    Se os queres matar: não cantes, não vejas, não escutes, não toques, não sintas, não penses, não vivas.
    Morrem mais depressa os "normais" que os "Loucos"...

    Beijinho e com prazer vivo nas tuas palavras.

    Marisela, feliz dia
  36. Anónimo Says:
    Li, reli e voltei a ler e continuaria por aí fora... nada melhor do q matar os poetas... era a forma de matar a alma do mundo!!! Mas não conseguem ... eles surgem de tds os lados, felizmente!

    Parabéns, da serenidade à revolta, está cá tudo!!!

    1 beijo
  37. greentea Says:
    felizmente nao pertenço ao Clube dos Poetas Mortos...
    Estou viva

    e não sou
    Poeta

    Bora daqui.
  38. Anónimo Says:
    "A situação assim o exige."
    Mais poesia todos os dias.
    Tosos os dias da poesia.
    Um abraço
  39. digoeu Says:
    também gosto de Daniel Filipe!!
    A invenção do amor é um poema supremo!
    gostei do teu texto!
    ;)
  40. joaninha Says:
    Entrando pela manhã,
    lendo a tua poesia
    que inspirou
    e encheu de alegria...
    esta tua fã,
    para quem o sonho acabou...
    Obrigada e Beijinhos
  41. Anónimo Says:
    Psst...
    Mtos beijos xeios de sorrisos
    Oh goto tt de ti meu lindo =D
  42. Anónimo Says:
    Fizeste-me lembrar "A Invenção do amor" e está tudo dito. Porque me fizeste lembrar de uma forma que verdadeiramente me emocionou. Tu és sem dúvida um poeta!
    Beijos
  43. Francesca Says:
    :) Gostei menino, gostei bastante :)

    Beijinho grande
  44. Light Says:
    sempre poesia!!!
    Bj G.
  45. pecado original Says:
    "Matem os poetas"

    Ups! Acho que andas a correr perigo de vida...

    :) Linda forma de contrariar o que se sente.
    Excelente musica que aqui se vive.

    beijinho de canela
  46. Å®t Øf £övë Says:
    Bonitas palavras as tuas para assinalar o dia mundial da poesia.
    Abraço.
  47. Anónimo Says:
    Já o tinha lido anteriormente...gostei de voltar a ler. Beijinhos e um bom fim de semana :)
  48. Dad Says:
    Nem calculas como fiquei contente de descobrir o teu blog hoje, dia em que vou jantar com alguns dos blogueiros! Para mim o Daniel Filipe foi um dos grandes poetas da nossa língua. Este manifesto pró liberdade, num país acorrentado, marcou muito a minha vida e esta tua versão / resposta está linda.
    Lá...onde existe a liberdade total, o Daniel Filipe, ficaria feliz de te ler e eu também fiquei!
    Gostei de te conhecer. Hasta siempre!

    Um óptimo fim de semana, apesar de, em todas as esquinas da cidade, se estar na eminência de apanhar chuva...mas melhor isso do que sermos perseguidos por um qualquer ditador...para quem o amor era uma ameaça tremenda...
    Bjito,
  49. Lady Says:
    Engraçado... quando li este poema de imediato me lembrei dum livro de poemas que em tempos li... "A invenção do amor e outros poemas" de Daniel Filipe... Nem imaginas a semelhança... Um beijinho grande e obrigado pela partilha...
  50. lena Says:
    sem dúvida que és um poeta

    como conheço bem o poema de Daniel Filipe

    fizeste com que me lembrasse dele e com saudade


    mas aqui, agora e daqui para a frente tenho a certeza: és tu o poeta

    parabéns meu querido amigo pela tua bela poesia que me dá tanto prazer ler

    beijinhos muitos para ti

    lena
  51. Eli Says:
    Onde andava eu?... :(

    Há tanto aqui. Mesmo.

    E... não tenho medo.

    Poesia triunfará enquanto houver quem sinta.

    :)
  52. Anónimo Says:
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